sábado, 19 de novembro de 2011

C. C. 11 - Not Alone


Coração Caleidoscópio 11
Not Alone

Eram cinco horas da manhã. O sol ainda não havia aparecido, ainda estava acordando e renovando suas forças para que fortificasse tudo novamente. Louise abriu o olho esquerdo, e discretamente olhou para seu lado. Não havia ninguém, o que ela já desconfiava e já estava preparada.
Virou e ficou deitada de frente para a outra parede, onde podia ver a porta do quarto. Estava tudo um pouco escuro, exceto pela luz que vinha da rua, pois a janela estava aberta. Escutou passos, mas não fingiu estar dormindo: continuou com os olhos abertos e a cabeça apoiada nas mãos.
Bovary abriu a porta. Ele estava com uma bermuda estampada e sem camisa. Estava descalço, também. Caminhou até a cama, sentou-se do lado dela, com os braços apoiados na mesma.
— Pensei que estivesse dormindo. Sussurrou e abriu um sorriso.
— Pensei que tinha me abandonado. De novo. Puxou o canto da boca retamente para a esquerda.
Ele balançou a cabeça negativamente, com o sorriso ainda no rosto.
— De novo por que? Puxou uma mecha de cabelo dela e colocou atrás da orelha.
— Na primeira vez que dormiu em casa eu acordei sem você, lembra? Ela riu.
— Lembro... Spen abaixou a cabeça, e depois de um pouco a apoiou no colchão. Louise estava com um braço solto, pendente para fora da cama. Ele pegou em sua mão.
— Alguém perguntou para você sobre mim, nesses últimos tempos?
— Meus pais.
— E o que respondeu?
— Que você estava em Londres, fazendo intercâmbio.
— E eles?
— Não falaram nada.
— Hm.
Ele se levantou e deitou do lado dela, encostado na parede. Virou-a de frente dele, acariciou o rosto dela.
— Senti falta disso. Senti falta de você. Muita.
Ela sorriu timidamente e fechou os olhos. Ele se aproximou e puxou o corpo dela em direção ao seu. Colocou os braços em volta da cintura de Ís e a beijou. Ela não correspondeu, e ele continuou o beijo; trazendo mais próximo de seu corpo o dela.
Ás vezes ela se perguntava o que acontecia, e se ele sentiu o que ela sentiu durante esse tempo fora. Ela acreditava que ele tinha sentido falta dela, falta do amor dela próximo dele, mas queria saber a intensidade dessa falta. Durante os trinta dias ela sentiu como se a cor do mundo dela tivesse ido embora, tornando tudo cinza, tudo incolor. E mesmo assim tentou fazer o que ele havia pedido: ser feliz. Quando ele disse isso, ela poderia ter entendido como um fim de relacionamento, mas os dois se entendiam, e sabiam o que era o significado desse “ser feliz”; era viver tudo como se o outro estivesse do seu lado, aproveitar os momentos como se ele/ela não estivesse distante.
— Você é meu? Porque eu estive aqui o tempo todo.
— Ainda pergunta, minha linda? Ele puxou a cabeça dela para perto de seu peito.
— Você me faz sentir como se eu não estivesse sozinha, e eu quase me senti tão sozinha nesses últimos tempos. Sussurrou.
— Nem mil anos do seu lado recompensaria a saudade que eu senti. Ah morena, eu te amo tanto! Ele beijou seus lábios novamente, deitou de barriga para cima e a puxou para cima dele.
— Você mudou tanto!
— Para bem ou para mal?
— Para perfeito.
— E você não me achava perfeito antes? Ele deu um tapa na cabeça dela. Ela riu, levantou a cabeça e olhou nos olhos dele.
— Você perguntou “Para bem ou para mal?”. Eu poderia responder para bem, para ótimo, para maravilhoso ou para perfeito! Dãr.
Devolveu o tapa. Os dois riram.
Ela o beijou novamente. Ele passou um braço em sua cintura e outro em seu pescoço. Ela abaixou a mão esquerda até a barriga definida de Spen; tinha arrumado uma nova mania de passar a mão naquela barriga que depois da viagem ficou tão mais durinha.
Ele se arrepiou e riu.
— O que foi? Ela perguntou toda inocente.
— Tenho arrepio na barriga, se é que não se lembra.
— Desculpa aí, tinha esquecido!
— Mas continua...
Ela riu, corou.
Ele a virou novamente, agora para o canto da parede, e encurralou-a.
— Nas minhas contas, ainda temos que fazer muitas coisas que não deram para ser feitas durante aquele tempo de ausência minha. Ele prolongou o u da palavra “muitas”. Levantou a sobrancelha esquerda e mordiscou o lábio inferior, abrindo depois um suntuoso sorriso malicioso.
— Não vamos perder tempo não, mon amour. Ela disse, passou a ponta da língua no lábio superior e piscou.
Riram. Começaram a se beijar, com aquele velho e sempre ardente fulgor.
Tiraram as pequenas máscaras da perversidade, ficaram sendo como são. Sabiam a hora de usarem essas máscaras, e muito bem a hora de tirarem.
Continuavam sendo, mesmo depois de tantos meses – quase um ano, os mesmos do começo. Spencer, o mesmo brincalhão desengonçado; Louise a mesma ingênua voluptuosa. Era a falta de um que completava o outro, e o exagero que igualava a falta.
Era o amor! Tão bonito, singelo, e imperfeito. O amor não é só qualidade, não é só sorrisos e olhares encantados; amor é principalmente a dor. A graça de amar é a dificuldade, é passar por momentos horríveis para que depois uma pequena coisa que por vias parece sem importância faça com que tudo se recompense e se renove. Amor é um ciclo, amor é nada.
Amor é incógnita que todos tentam entender e quanto mais procuram significados mais se perdem e voltam para o início. Quanto mais tentam encontrar motivos para explicar porque existe o amor, porque as pessoas amam, como elas amam, o jeito que amam, como expressar, como deixar de amar, mais tornam esse sentimento fútil. Sim, fútil. Porque, como podem dissecar algo que não há como tocar? É a sociedade e sua vontade de ter o que não tem como se ter, sentir o que não se pode sentir. É a sociedade e sua inútil e desvalorizada vontade de tornar tudo material, tudo fácil de se modificar, tudo codificado, para que quando alguém pergunte “Ah, o amor?” já tenham o significado e não titubeiem em responder todos os sintomas, males e benefícios. Logo, inventarão uma vacina para deixar de amar e outra para que amem. E sorte daqueles, que como eu, vivem sua vida sem ligar para o significado das coisas abstratas. Sorte daqueles, que como eu, não esperam sempre respostas em palavras, ou demonstrações literais; sorte daqueles, que como eu, ainda valorizam as atitudes, o por do Sol, o luar, a natureza, o sorriso, o olhar, o ser humano simples e puro, o mundo e tudo que ainda (graças ao Pai) não tentaram descobrir o significado. Homens, homens... Quando irão entender que o melhor da vida é viver sem códigos?

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